Budapeste...

...encontrei uma livraria aberta, entrei; se amanha deixasse o pais sem conseguir juntar duas palavras, levaria um dicionario como suvenir. Cheguei a uma prateleira repleta de grossos volumes, corri os olhos pelos titulos hungaros em seus dorsos e tive a visao de uma biblioteca deveras desorganizada, caotica. Depois observei melhor, e as capas estavam todas alinhadas, as letras é que pareciam fora de ordem. Por isso me chamou a atençao o livro mais modesto, mas com um titulo legivel: Hungarian in 100 lessons. Numa folheada entrevi alguns exercicios de conversaçao; este trem vai para a Bulgaria?; minha esposa é vegetariana; quanto mede o velho obelisco?; preciso comprar candelabros baratos; onde mora aquele soldado? Entao percebi a moça alta com uma mochila nas costas que olhava o livro em minhas maos e abanava a cabeça.  Pensei tratar-se de uma fiscal da casa, e que fosse proibido aos fregueses manusear a mercadoria. De pronto lhe estendi o livro, que ela agadanhou e jogou de qualquer jeito no fundo de uma prateleira. A rispidez do gesto, presumi que fosse uma caracteristica dos hunos, como as maças do rosto dela, um tanto salientes, ou os labios que julguei crueis, porque sem muita polpa. E quando ela afirmou que a lingua magiar nao se prende nos livros, fiquei pasmo, porque a sentença me soou perfeitamente inteligivel. Ainda me perguntei se ela teria se expressado em português, inglês, ou mesmo em romeno, mas tanto era hungaro que nao distingui uma so palavra. E contudo, nao me restava duvida, ela afirmara que a lingua magiar nao se aprende nos livros. Budapeste, CHICO BUARQUE.

Nenhum comentário: